Práticas fascistas e linchamento moral no Brasil
O suicidio do Reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Luiz Carlos Cancelier de Olivo, num shopping center de Florianópolis, nesta segunda-feira, 02 de outubro, traz um alerta importante sobre o nível de deterioração das instituições públicas e democráticas no Brasil. Na sua carta de despedida Cancelier fala da humilhação e vexame a que ele e alguns colegas foram submetidos pela polícia federal há uma semana, sendo levados para um complexo penitenciário, “despidos e encarcerados”, segundo suas próprias palavras. Ainda, segundo o Reitor, “Nos últimos dias tivemos nossas vidas devassadas e nossa honra associada a uma “quadrilha”, acusada de desviar R$ 80 milhões”. E, lembra, “a fragilidade das acusações que sobre mim pesam não subsiste à mínima capacidade de enxergar o que está por trás do equivocado processo que nos levou ao cárcere”. O Procurador Geral do Estado de Santa Catarina, João dos Passos Martins Neto, em Nota de Pesar, esclarece que Cancellier era “um homem digno, de poucas posses, que devotou os últimos aos de sua rica trajetória profissional à nobre causa do ensino, da pesquisa e da extensão universitária”. Independentemente de haver alguma suspeita sobre o acusado, o fato constitui um alerta importante sobre a deterioração de nossas instituições públicas e democráticas. Cancelier se matou por vergonha, por não suportar a desonra de seu nome, manchando sua história de vida e de sua família. Foi humilhado por um sistema de justiça, esclarece o Procurador Geral do Estado, “sedento de luz e fama, especializado em antecipar penas e martirizar inocentes, sob o falso pretexto de garantir a eficácia de suas investigações”. O acontecimento não é pontual revelando a emergência de práticas fascistas. Não se trata do velho fascismo de Mussollini e Hitles, mas de um tipo de fascismo social que, segundo o sociólogo português Boaventura Santos, emerge em situações de crise das instituições estatais e do sistema de direitos sociais e com valorização da cultura de mercadorização das pessoas e coisas. Uma característica importante do fascismo é que a definição do inimigo se faz antes das provas judiciais, independentemente de ser um judeu, um comunista, uma mulher, um negro ou um indio. O resultado sempre será o linchamento moral e sem chances de defesa ampla que considere a biografia e a memória do acusado. Não se trata de um caso isolado mas de um fenômeno mais amplo que estamos vendo, por exemplo, com o processo judicial contra Lula.
Paulo Henrique Martins é sociólogo e professor visitante da UFC